(Texto originalmente publicado no jornal Diário do Pará, caderno Você, coluna #DiárioCultural de 04/11/2014)
Finalmente, na última semana, consegui
ver o ótimo filme Nebraska (Nebraska), novo longa de Alexander Payne (Sideways,
Os Descendentes). Bruce Dern vive um velho rabugento, que acredita ter ganhado
um milhão de dólares em uma promoção de marketing e decide ir atrás do prêmio,
em outro Estado, milhares de quilômetros longe de casa. Mesmo sabendo que se
trata de um golpe, o filho decide acompanhá-lo, pois este já apresenta sinais de
demência. O rapaz (interpretado de maneira bem contida pelo comediante Will
Forte) também pretende passar um tempo ao lado dele para entender o porquê de
tanta amargura e insensibilidade com os filhos. É um road movie simples,
filmado em preto e branco, que extrai o melhor do seu elenco, com destaque para
as espetaculares atuações do veterano Dern e June Squibb, como sua impaciente e
desbocada esposa (Os dois indicados com justiça ao Oscar desse ano).
O que Payne conseguiu pode ser
considerado um êxito, pois ele filmou a história do casal de velhinhos fugindo
completamente dos clichês que cercam as atuações reservadas para as atores mais
experientes. São relativamente raras as produções que são sensíveis ao abordar
a relação da velhice com as limitações físicas e emocionais, além da finitude
da vida. Nebraska me lembrou de imediato ao clássico de Ingmar Bergman,
Morangos Silvestres (Smultronstället), onde um professor universitário acerta
as contas com o passado após uma série de sonhos estranhos e durante uma viagem
para receber uma honraria. Em comum, as obras se tornam “filmes de estrada” e
têm personagens difíceis de lidar.
A temática do envelhecimento foi a
tônica do trabalhos de dois dos maiores cineastas de Hollywood. O primeiro foi
Hal Ashby, com o polêmico Ensina-me a Viver (Harold and Maude). Em 1971, Ashby
filmou uma peculiar história de amor entre uma idosa e um garoto que tem um
estranho fascínio pela morte. Com a sutileza própria do autor, o amor aqui não
cai em contornos bizarros, mas o que domina é a delicadeza em uma relação mais
matriarcal que física. Hal Ashby dirigiu um dos meus favoritos, Muito Além do
Jardim (Being There), sobre o qual falarei um dia nesta coluna.
O segundo diretor a se resignar diante
do tempo é Clint Eastwood, só que com menos sutileza. Em Menina de Ouro
(Million Dolar Baby), o eterno Blondie mostra-se seco e cruel, em um exercício
onde a metáfora do Boxe não poderia ser mais apropriada. Já no apenas bom Gran
Torino (Gran Torino), o pistoleiro se redime diante do preconceito racista da
sociedade moderna. Por outro
lado, em 2012, Michael Haneke jogou na cara do público que a velhice pode ser
cruel quando ela quebra uma rotina administrada com todo o carinho e atenção.
Amor (Amour) é a melhor obra do austríaco, já acostumado a usar o cinema como
um exercício sádico sobre a dor humana. A história do senhor que sofre em ver a
mulher se degenerar aos seus olhos é chocante, amarga e os seus gestos de
desespero são compreensivos.
De alguma forma, o cinemão americano
também costuma dar alguma leveza a histórias sobre velhice. Três bons exemplos
são a ótima animação da Pixar UP (UP), o clássico da Sessão da Tarde Cocoon
(Cocoon) e o cultuado Conduzindo Miss Daisy (Driving Miss Daisy). Nesses casos, se
não podemos lutar contra a passagem do tempo, podemos pelo menos aproveitá-la
da melhor maneira possível. Seja a bordo de uma casa de balões, uma nave
espacial ou apenas um carro antigo.
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