segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

Que Horas ela volta (2015)



Provavelmente fui uma das últimas pessoas a ver Que Horas Ela Volta (2015), quando o filme já possuía todo o respeito diante da crítica e público. A curiosidade só aumentou quando a obra foi a indicada brasileira ao Oscar de 2016, já que o representante do Brasil deste ano, Hoje Eu Quero Voltar Sozinho, apesar de não ficar entre os finalistas, é excelente e um dos melhores de 2014.
E a obra dirigida e roteirizada por Anna Muylaert merece todas as loas e o hype criado em cima desta. É um filme bem dirigido, enquadrado e que se beneficia naturalmente das pequenas mise-em-scènes que a diretora cria nos ambientes da casa da família de classe onde mora (sobrevive?) a doméstica nordestina Val. Tida como “quase da família”, ela encara pequenas humilhações diárias como algo natural, em prol do amor que tem por aquelas pessoas.
A fotografia, ótima, consegue transformar o quase único cenário da narrativa, a residência dos patrões, em um ambiente dúbio: há momentos que o local é acolhedor e iluminado e em outros, se torna escuro e opressor, como a mão pesada que o sistema social trata a relação entre empregado e empregador.  No caso específico da obra de Muylaert, é esfregado no nosso rosto como o dinheiro é divisor de castas no Brasil. E como pessoas são vistas como subespécies, que servem apenas para limpar ou servir gente que é incapaz de levantar de um sofá para pegar um sorvete na geladeira ou até mesmo um copo d’água, enquanto está com a cara enfurnada no celular.
É um choque de gerações (principalmente entre os dois adolescentes: um tem tudo, a outra tem que lutar pelos seus ideais, mesmo diante de muitos obstáculos pela frente). O final é poético e desconstrói o início da trama, quando Val deixa de cuidar da própria filha, para “educar” o filho daqueles que acham que o dinheiro é capaz até de comprar amor e respeito. Não vou dar spoiler, mas se vocês entenderem essa “ponte” narrativa, entenderão como a história é ótima em vários pontos de vistas.  
E quanto à falada atuação de Regina Casé, todas as críticas positivas se justificam: a sua Val é cheia de virtudes e maneirismos típicos que você esquece que quem está ali é uma apresentadora de televisão. Nos pequenos gestos, na fala contida, no conformismo do olhar ou nos diálogos improvisados estão os seus valores como atriz. Se o Oscar fosse um prêmio justo, Casé merecia uma indicação. Seu trabalho é primoroso e um dos melhores que já vi no cinema brasileiro. Destaque também para Carmila Márdila, como Jéssica, rebelde e questionadora, como os jovens devem ser. E para o quadrinhista e escritor Lourenço Mutarelli, como o conformado Carlos.
Desde já estou torcendo que a película fique entre os finalistas do Oscar: Muylaert e Regina Casé merecem ser reconhecidas mundialmente por este grande filme.

Nenhum comentário: