segunda-feira, 22 de maio de 2017

Desrespeito ao próprio legado





10 em cada 10 cinéfilos e críticos consideram o primeiro Alien, de 1979, uma obra-prima do cinema. Os motivos são diversos, mas principalmente pelo roteiro bem construído e o clima de claustrofobia e medo que o diretor Ridley Scott conseguiu impor a uma das maiores produções de ficção científica.  Por isso, foi com empolgação que recebemos a notícia que Scott voltaria à mitologia que criou, com Prometheus (2012). Infelizmente, a frustração se fez presente quando os créditos subiram. O filme era fraco e não tinha quase nada da produção original.
Pois bem, o diretor voltou definitivamente ao cânone dos xenomorfos este ano com Alien Covenant. E o resultado não podia ser pior. Scott desrespeita a história de Dan O’Bannon e o trabalho magistral de arte do H.R. Giger. Pouco, muito pouco sobrou disso tudo. Os monstros são feitos de um CGI sem criatividade, a fotografia é escura e preguiçosa, e a direção é péssima. Teve momentos em que eu não entendia o que estava acontecendo e nem quem tinha morrido. E isso é péssimo vindo de um cara que dirigiu outros grandes filmes, como Blade Runner, Thelma e Louise e Gladiador (mas também cometeu coisas horríveis como Até o Limite da Honra e Hannibal).
A narrativa não ajuda muito também. Os personagens são esquecíveis, a protagonista (vivida por Katherine Waterston) não tem carisma nenhum (saudades, Sigouney Weaver). Nem Michael Fassbender salva, já que seus androides são programados com filosofias clichê (até os robôs da trilogia original eram melhores). Como se não bastasse, o clímax é enfadonho e sem sentido e as ações não se justificam. Chega a ser ridículo um exemplar da saga ter como ameaça pólens alienígenas (?!).  Fora que há furos inacreditáveis. Um exemplo é o tempo de incubação dos monstros nos hospedeiros humanos. John Hurt demorou horas para ter o peito aberto por um xenomorfo há 4 décadas. Hoje, basta alguns segundos. E a cena do simbionte sendo revelado não tem um décimo do impacto original.
E se você tem ao menos a esperança de saber o que aconteceu após o final de Prometheus, esquece também.  Não há a menor intenção de continuar aquela história e, para isso, a revelação do destino da personagem sobrevivente lá atrás não se sustenta, infelizmente, deixando os poucos fãs da obra anterior do cineasta bem frustrados. Pior que Scott já anunciou uma nova continuação para 2019, não se importando nem um pouco em destruir o próprio legado. . 

segunda-feira, 15 de maio de 2017

A morte lhe cai bem




Quando escrevi sobre Rua Cloverfield, 10 (Cloverfield Lane, 2016), expliquei que admirava diretores de cinema que conseguem fazer bons filmes de suspense e terror em cenários restritos. Algo que James Wan (Sobrenatural, Invocação do Mal) faz com competência e que M. Night Shyamalan tentou em Fragmentado (Split, 2017), apesar de problemas no roteiro, sobretudo. E agora o norueguês Andre Øvredal, com apenas um longa-metragem no currículo (Caçadores de Trolls, 2010), se mostra eficiente no assunto com A Autópsia (The Autopsy of Jane Doe, 2017).
A Autópsia tem apenas um necrotério como locação e foca totalmente na relação entre um médico legista (O veterano Brian Cox) e o filho, que trabalha como seu assistente na análise de cadáveres (Emily Hitsch, que já foi uma promessa em Hollywood quando fez Na Natureza Selvagem e Speed Racer).  O trabalho ia bem, até que eles recebem uma missão do xerife da cidade: identificar a causa da morte de bela jovem, encontrada no porão de uma casa onde ocorreu uma chacina. O cadáver parece completamente intacto e as dificuldades começam à medida que eles o examinam, pois a situação é mais complexa e angustiante do que imaginam.
O thriller trabalha bem a tensão inicial com as descobertas sinistras e apela para um gore intencional e necessário, ao mostrar a dissecação dos corpos em detalhes, com sangue e órgãos expostos deliberadamente. O problema é que o roteiro parece se direcionar para uma trama detetivesca e termina indo para o lado fortemente sobrenatural. Nenhum problema, se a história não decidisse ignorar os elementos da primeira meia hora, como se fossem dois filmes diferentes, ao incluir espíritos e alucinações na equação. A partir daí as motivações surreais e as explicações se tornam meio sem sentido e há diversos furos no roteiro, que são ignorados até o final da película.
Mesmo assim, Øvredal trabalha bem os momentos de tensão, usando elementos simbólicos, como espelhos e, principalmente, sinos de mortos (uma cena, especificamente, é absurdamente amedrontadora), além do próprio necrotério, antigo e nada acolhedor. A trilha sonora é simples e usada com certa parcimônia, o que enriquece a experiência solitária e mórbida do local onde se passa a ação. Enfim, é um daqueles filmes de gênero simples, corretos e que servem como um bom passatempo para uma sessão com pipoca e refrigerante. Isso se você tiver estômago para comer vendo um cérebro sendo aberto, claro.

segunda-feira, 8 de maio de 2017

Essa família é muito unida...


Nos seus primeiros anos no cinema, James Gunn trabalhou na obscura produtora Troma, conhecida por seus filmes de “terrir” (terror+trash+comédias). Lá ele escreveu coisas como Tromeu e Julieta (1996).  Começou a ganhar notoriedade na indústria escrevendo roteiros dos filmes do Scooby Doo (!) e o ótimo Madrugada dos Mortos (2004).  Seu primeiro sucesso foi o trash Slither – Seres Rastejantes (2006) e, logo em seguida, fez a boa comédia Super (2010), que mostrou um super-herói atrapalhado e rendeu o convite para dirigir Os Guardiões da Galáxia (2014).
Foi uma aposta arriscada da Marvel investir em um diretor sem notoriedade, mas o ritmo, o humor e a nostalgia do primeiro filme tornaram a aventura do grupo quase desconhecido, um sucesso de público e crítica e fizeram a fama do cineasta. Três anos depois, a continuação chega à tela grande, prometendo repetir o sucesso e encher os cofres dos estúdios da editora. E Gunn acerta novamente ao manter o mesmo clima de “time que está ganhando não se mexe”.
E Guardiões da Galáxia 2 (2017) parece mesmo uma grande e divertida reunião de família. O elenco, encabeçado por Chris Pratt e Zoe Saldana, está bem à vontade nos seus papéis, com destaque para uma improvável veia humorística do lutador de MMA Dave Bautista. E você vai morrer de fofura com o Baby Groot.  E não são só os atores que parecem estar se divertindo a beça. Os designs de som e de produção jogaram todo o bom senso para o alto e decidiram embarcar no absurdo proposto. São naves com sons que imitam fliperamas, céu colorido de Flash Gordon, figurino que parecem saídos de Barbarela e alienígenas com maquiagens bizarras, num contraste entre antigo e futurista, as matinês e o ciberpunk.
Não tão dinâmico quanto o primeiro, já que algumas passagens são bem arrastadas, a película mantém a atenção do espectador com sequências cartunescas, como desenhos do Chuck Jones. Vilões sendo jogados para o alto inúmeras vezes e uma sequencia sem noção com rostos deformados pela travessia espaço-tempo garantem boas risadas.  Mas a diversão mesmo está no fascínio pelos exagerados anos 80, seja com a estética kitsch, seja com a participação de astros da época, como Kurt Russel, Sylvester Stallone e David Hasselhoff.
A trilha sonora, a exemplo da primeira aventura, continua deliciosamente datada. A música passeia pelo filme e é impossível ficar parado, sem mexer pelo menos os pés nas poltronas do cinema ouvindo Electric Light Orchestra (em uma sequência inicial sensacional), Fleetwood Mac e George Harrison. E se não se emocionar ouvindo Cat Stevens cantando Father e Son, você é mais insensível que o Drax.