segunda-feira, 25 de julho de 2016

O monstro da nostalgia



O que falar de “Stranger Things”, de que mal assisti a primeira temporada e já considero pacas? Bem, primeiro que é uma “covardia” a Netflix lançar a série homenageando os anos 1980, período da infância da maioria dos seus clientes, que está na marca dos 30 anos. É uma visão estratégica da empresa, para fidelizar e atrair novos assinantes. E deu certo demais, pois pegou no ponto fraco dos cinéfilos: a nostalgia.
E notem que os nostálgicos são praticamente um nicho de mercado atual. É só vermos os novos filmes baseados em sucessos daquele período, como Caça-Fantasmas, Blade Runner, e da série MacGyver. Mas nenhum deles parece ter a “cara-de-pau” dos irmãos Matt e Ross Duffer, criadores da nova série, em copiar os melhores conceitos dos grandes filmes daquela época. E tudo funciona muito bem, graças à capacidade que eles tiveram em prestar muitas, mas muitas homenagens, e manter um roteiro decente e um trabalho honesto.
A sensação de déjà vu está presente em cada frame do seriado. Uma gama considerável de diretores tiveram seu estilo de filmar copiado pela série. A maneira como Steven Spielberg trabalha, com a câmera na altura das crianças, por exemplo. O humor negro e ingênuo dos roteiros de Robert Zemeckis e Fred Dekker. A tensão presente em Tobe Hopper e John Carpenter. O estilo acelerado de Sam Raimi. E a trilha é uma emulação descarada de Vangelis, com sintetizadores e teclados se sobrepondo, e alguns pontos com uma atmosfera gótica do grupo Goblin, famoso por fazer a composição de produções de horror italianas. Sem contar as músicas de Jefferson Airplane e The Clash (cuja “Should I Stay or Should I Go” é essencial para a história) que embalam as cenas.
O roteiro parece escrito por um Stephen King inspirado e adaptado a quatro mãos por John Landis e John Hughes. Crianças curiosas, conflitos de adolescentes, criaturas sobrenaturais em pequenas cidades americanas, mundos alternativos. Até algumas cenas repetidas daqueles filmes são copiadas aqui, como o cientista malvado que pouco fala e a facilidade em se entrar em instalações que deveriam ser de segurança máxima. Como é divertido encontrar todas as referências. O resumo, em si, já é um amontoado de (bons) clichês: vários habitantes de Hawkings são mobilizados para achar um garoto desaparecido, enquanto um monstro ataca pessoas na calada da noite.
O figurino, cabelos e cenários saíram de “Os Fantasmas se Divertem” (nem preciso dizer que Tim Burton é outro homenageado) . Não é à toa que Winona Ryder tem uma forte presença na série como a protagonista. Ela simplesmente dá um show em cena como a mãe desesperada para encontrar o filho desaparecido. Já Matthew Modine praticamente repete o papel de Peter Coyote em ET, o Extraterrestre, como o cientista cheio de segredos e poderes. E é claro que a narrativa não funcionaria se o elenco infantil não causasse empatia. Eles são tão carismáticos, inteligentes e divertidos quanto a garotada de “Goonies” e “Conta Comigo”. Rimos com eles e tememos por suas vidas. Eis a fórmula principal do sucesso de “Stranger Things”: nos sentimos crianças novamente. Queremos mais disso, lógico.

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