O Regresso (The Revenant, 2015) venceu três Oscars. Dois deles foram merecidos. Um não. Então, para poder falar sobre o filme, vamos começar pelo prêmio da academia que menos provoca discussão: o de Melhor Ator. Criou-se uma aura de injustiçado sobre Leonardo DiCaprio, mesmo que ele tivesse poucas indicações (4 no total). DiCaprio é um ator excelente, que já teve grandes momentos no cinema. Meu favorito é o personagem dele no espetacular e subestimado “Ilha do Medo” (Shutter Island, 2010) do mestre Martin Scorsese.
Apesar de não ter seu melhor momento na produção atual, não se pode dizer que ele não mereceu. Sua entrega física e psicológica para compor Hugh Glass, que foi deixado à morte em um ambiente hostil e busca vingança, é fascinante. Os ótimos Tom Hardy e Domhnall Glesson completam o bom elenco. A outra estatueta merecida foi para a Fotografia de Emmanuel Lubezki. Eu torcia particularmente para John Seale, que faz um trabalho absurdamente bonito em “Mad Max – Estrada da Fúria”. Mas Lubezki é um grande profissional. Tem domínio de cena, mesmo em condições adversas, das cores, e consegue fazer boas sequências com luz natural.
Mas “O Regresso” também tem problemas. A começar pelo roteiro. O script de Mark L. Smith se esforça para dar um caráter espiritual à jornada contra a morte de Glass, como se os esforços sangrentos dele para sobreviver não fossem fortes o suficiente para a história. E são. Entretanto, há uma clara dicotomia entre realismo e religiosidade aqui, que distrai quem assiste e quebra o próprio ritmo da narrativa. E ainda tenta forçar uma relação íntima do caçador com os índios, que também não acrescenta nada à trama, apesar de servir para selar (ou não) o destino dos personagens. Para terminar, alguns furos incomodam bastante (como um capitão vai caçar um fugitivo sozinho, quando tinha um exercito, o filme inteiro, à sua disposição?).
O que nos traz a outra dificuldade da película de se estabelecer como um dos grandes épicos históricos do cinema: a própria direção de Alejandro González Iñárritu. Não posso dizer que sou fã do cineasta. Acho “Babel” e “21 Gramas” bem fracos. Por outro lado, me surpreendi com “Birdman”, que é um grande filme do início ao fim. No trabalho que lhe deu o Oscar, Iñarritu tenta dar uma dimensão onírica ao próprio ofício, investindo em longos planos-sequências (o que funciona no início apenas), estranhos movimentos de câmera e opções visuais duvidosas (sangue respingando e respiração embaçando lentes), mas só consegue soar auto-indulgente. Iñarritu quer ser Terrence Malick, mas só consegue se comparar com Steven Spielberg, em seus piores momentos. Isso compromete definitivamente a história, que poderia ganhar uma dimensão mais realista, perturbadora e igualmente fascinante. Ou seja, uma bela oportunidade quase jogada fora. Fica a certeza que esse prêmio deveria estar nas mãos de George Miller e sua desert ópera enlouquecida. Mas a Academia nunca foi conhecida por fazer justiça aos seus.
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