Michael Haneke gosta de torturar o seu público. Em Violência
Gratuita, levava o telespectador ao extremo da violência, jogando-o como
cúmplice. Já no filme Caché, este era obrigado a acompanhar o olhar voyuer dos
protagonista, levando o cinéfilo ao extremo da metalinguagem do cinema. Em Amour,
sua mais recente obra, a tortura é imaginada usando todos os recursos estilísticos
e técnicos do cinema em um exercício quase sádico.
Aqui, Haneke prova sua genialidade. Os planos longos e
silenciosos expõem todo o incômodo que um deles tem que enfrentar diante de uma
rotina cruel que vai se impondo. Não há mais música que relaxe. E um simples
gesto de dar água se transforma em um sacrifício dificil de lidar, e não é a
toa que a violência acaba subindo à superfície, vergonhosa e sofrida.
O filme viaja para o futuro na primeira cena, enquanto
policiais abrem o quarto trancado, com fitas e chaves e encontram um corpo sereno,
sem vida, mas poeticamente ameaçado pelo fedor que incomoda quem está ali. Essa
dicotomia entre o belo e o morto trespassa por toda a película. Música e
silêncio. Vida e Morte.
A imagem da platéia de um concerto que nunca é mostrado
reflete bem a angústia de se deparar com algo que não podemos dominar. Somos
incapazes de virar a câmera pra ver o palco. E assim, obrigados a focar apenas
na platéia, ficamos. Assim é a Morte. Nada podemos fazer, a não ser contemplar
aquilo que ela quer.
E como é amargo o gosto de sua aproximação. Não há poesia em
ver alguém que se ama prostrado na cama, e se sentir incapaz. O gesto,
extremado, é chocante, mas compreendido. A renúncia poderia significar um
recomeço, em um sonho quase absurdo, de ver a simples rotina de lavar pratos e
sair para passear de volta. Mas, o impossível toma conta e só resta aprisionar
o resto de amor que a amargura não levou em uma caixa. Aquele velho quarto, de
tantas memórias. Afinal, enterros não valem a pena. São bizarros, na palavra do
próprio protagonista. E sobra apenas a falsa ironia do título da obra.
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