quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Sete Psicopatas e um Shi Tzu (Seven Psycopaths, 2012)


O diretor Martin McDonagh surgiu para o mundo do cinema com o ótimo Na Mira do Chefe (In Bruges, 2008). Naquele filme, ele contava uma fábula social sobre a violência e atuação dos assassinos de aluguel, sob a perspectiva do elenco formado pelos excelentes Brendan Gleeson, Colin Farrell e Ralph Fiennes. No seu novo trabalho, Martin transporta o mesmo conto moral para uma ensolarada e desértica Los Angeles. 

Dessa vez, a violência chega à meca do cinema americano. Mcdonagh amplia o estilismo bruto ao criar vários personagens em uma história que demora a engrenar e quando a quinta marcha é engatada, o ritmo fica comprometido.

O filme conta a história de um escritor e roteirista (Colin Farrel), que sofre de bloqueio criativo e não consegue terminar um novo roteiro sobre sete psicopatas, com histórias cruzadas (Os Seven Psycopaths do títulos). Mas, ele acaba sendo “ajudado” por um amigo sequestrador de cães (Sam Rockwell, se divertindo muito no papel), e acaba dando de cara com os psicopatas na “vida real”.



 Apesar dos inúmeros problemas, a película tem participações divertidíssimas de Christopher Walken (que adora esses papéis de loucos), do músico Tom Waits e Woody Harrelson, que divide a cena com o cãozinho do título e parece mais um desses empresários ricos cheios de vontades que propriamente um mafioso.

Indo e vindo no tempo e alternando cenas com os personagens, o diretor tenta amarrar a trama dando toques tarantinescos nos diálogos, mas acrescentando um bem vindo acorde surreal a lá David Linch. Mas, é uma pena que a sinfonia perca peso nas notas finais. No fim, a impressão que fica é que a história, boa, se perdeu nos trilhos no excesso criativo da forma e estilo empregados. Mesmo assim, Martin Mcdonagh está acima da média dos muitos diretores jogados todos os anos por Hollywood como “novos Guy Ritchies”. Vale uma boa espiada.




segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Escritor paraense lança primeiro livro com 100% de patrocínios vindos da Internet



O jornalista e escritor Anderson Araújo, 34, lança o livro "Bêbado Gonzo e outras histórias", dia 5 de março próximo, na Fox Vídeo da Travessa Doutor Moraes, às 18h30. São 25 contos e crônicas, entre textos inéditos e reeditados do blog homônimo criado em 2009. Com histórias com personagens, cenários e situações de Belém, fugindo do regionalismo tradicional, a publicação foi viabilizada com apoios feitos por crowdfunding,  financiamento coletivo através da Internet, inaugurando no Pará uma nova forma de captação de recursos para autores sem editora.
Bêbado Gonzo passou uma campanha de arrecadação de dois meses. O projeto para financiar o livro ficou hospedado no mais tradicional site de financiamento coletivo do Brasil, o Catarse (www.catarse.me), criado em 2009. O autor estipulou o valor de R$ 6.818 para produzir a primeira tiragem e, ao final da empreitada, conseguiu R$ 8.010. Para Anderson, a nova forma de captação de recursos pode ser uma alternativa ao eterno "pires na mão" dos novos escritores ainda sem editora ou patrocinadores para tornar um projeto literário em realidade.
"Foi uma alternativa satisfatória, principalmente, em se tratando de Belém, uma cidade com pouca tradição de editores, de gente realmente interessada em produção nova para transformar em produto e colocá-lo nas estantes para a venda. Espero que experiência com o Bêbado Gonzo estimule novos autores a transformarem suas ideias em livros de verdade. Torço por isso", diz o escritor.
O livro recebeu apoio em doações em dinheiro, entre R$ 20 e R$ 1 mil, de 91 pessoas de Belém e várias cidades paraenses, como Castanhal, Marabá, Paragominas, Santarém e Tucuruí, mas também de municípios de outros Estados como Macapá, Fortaleza, Brasília, São Paulo e Porto Alegre. Segundo o idealizador da proposta, o êxito da campanha está ligado à boa vontade dos que já conheciam os textos no blog, mas também a facilidade de comunicação e propaganda através das redes sociais virtuais, como Facebook e Twitter.
O livro tem contos e crônicas que mostram detalhes pitorescos e situações típicas de Belém, como na crônica de abertura do livro "O choro da pata" e no conto/crônica "O conto secreto do maldito palhaço assassino de gatos". A obra tem ainda situações improváveis como o a capital paraense sob ameaça no conto "Zumbis em Belém" e a prisão de um serial killer de corruptos em "O assassino". Há ainda textos líricos e íntimos como "A visita", "A máquina de escrever" e "O canto do galo", mas também situações tragicômicas baseadas em relatos cotidianos e nas observações do autor, como repórter que é há quase dez anos, é o caso de "Rasga-bíblia", "Maquinho Galo Duro" e "A balada perdida de Carlos Enoque".
"Bêbado Gonzo"  foi editado pelo autor e tem projeto gráfico da designer e publicitária Gabi Dias, ilustrações de  Diego Michel e diagramação de Érico Miranda. O livro tem 192 páginas e estará à venda nas lojas da Fox Vídeo (na Travessa Doutor Moraes e na Doca de Souza Franco) por R$ 29,90.  Em breve, a publicação também estará disponível em Ebook.

Serviço:
O livro "Bêbado Gonzo e outras histórias", de Anderson Araújo, será lançado no dia 5 de março (terça-feira), a partir das 18h30, na Fox Vídeo, que fica na Travessa Doutor Moraes, 584, bairro de Batista Campos, entre a Avenida Conselheiro Furtado e Rua dos Mundurucus.

Confira o Trecho da crônica de abertura do livro, "O choro da pata":
"(...) O pato e a pata pareciam conscientes do seu destino. Nas horas derradeiras, eles perceberam a movimentação e não saíram para o quintal. Ficaram ambos acuados no canto onde dormiam, faziam amor e ela colocava os ovos, com os olhos arregalados que os patos têm a vida inteira.
Da janela, ficamos olhando os dois, morrendo de dó. Condenados à morte por crime nenhum. Muita injustiça. Minha irmã Andréa chorava e eu ali, indignado e de mãos atadas contra a tirania dos adultos.
A hora havia chegado e minha tia Kátia, sem muito preparo para a tarefa, foi ser o verdugo das aves. Por algum motivo desconhecido, ela pegou primeiro o patarrão. Ficamos apavorados.
Ele se debateu todo, mas foi dominado pelas asas. Era um bicho bonito, grande, com penas escuras meio esverdeadas, a cabeça branca e aquela membrana vermelha em cima do bico, para dar o charme.
Resolvi me traumatizar de propósito e assistir o abate do amigo emplumado. Era minha forma de dizer adeus. Ele foi levado para o jirau e levou uma pancada para ficar zonzo e não se mexer muito durante a decapitação. Quando a faca foi baixar no pescoço, não tive coragem de olhar. Desviei e o mundo começou a apresentar as surpresas próprias do caos.
Sem muita força, Kátia jamais desconfiou que o bicho não desistiria fácil. No golpe mal dado, o animal se desprendeu, saiu rebatendo panelas, derrubando cacarecos e lambuzando o quintal de sangue para desespero dos pequeninos que já estavam na porta da cozinha para assistir à cena bizarra.
Ninguém teve coragem de impedir a última caminhada do patarrão que, como um zumbi, andava milagrosamente com a cabeça pendurada por um fio de pele, degolado. Mesmo morto, ele tomou o caminho de sempre e foi para o canto que sempre ficava com sua companheira.
Corremos para a janela lateral para acompanhar aquele espetáculo inacreditável. Ao ver o marido chegar, sem cabeça, em andar troncho dos mortos-vivos, a pata recuou até onde não pode mais, como se fugisse do horror, e ficou imóvel diante da cena.
Com a ferida letal, o pato parou a pouco mais de um metro da fêmea e deu os últimos suspiros já sem nenhuma força para continuar sua demonstração impressionante de resistência.
A essa hora as crianças já choravam. Os primos menores, sem entender muito, ficavam na ponta do pé para espiar pela janela o que estava acontecendo e os adultos também pararam tudo para olhar. Minha mãe inclusive lamentou não ter uma filmadora para registrar aqueles momentos estranhíssimos.

Muito comovido, assisti a todo o desenrolar do último adeus do pato e, diante do fato, o primeiro sinal de vocação para a função que me acompanha até hoje se revelou e estampei a manchete sonora: OLHEM! A PATA ESTÁ CHORANDO! (...)".

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

5 motivos para ver Community




Chevy Chase

Chevy Chase era um astro do cinema na década de 70 e 80, com filmes como Férias Frustradas. Mas, a partir da década de 1990, deu uma bela sumida. Ressurgiu agora, quando foi convidado a participar de Community pelo criador da série, Dan Harmon. E faz o seu melhor papel como o empresário “de lenços de papel” Pierce Hawthorne, misógino, preconceituoso, egoísta e extremamente engraçado. Uma pena que Chase seja um astro difícil de lidar. Ele falou mal da série e disse que o elenco “não é grande coisa”. Foi demitido nesta 4ª temporada por dar tantos problemas à produção. Uma pena. Pierce fará falta.


As cenas durante os créditos

Dos “talk-shows” Troy e Abed in The Morning aos raps de improviso, as cenas que acontecem durante os créditos são um show a parte e mostram que Community leva muito a sério as referências em cada segundo do programa.


 Zumbis, Nintendo 8 bits e Batman:

Cada episódio de Community é uma surpresa pop nova. Incrível como a série consegue se renovar a cada história, contando com pontos de vistas diferentes, metalinguagens e recursos narrativos novos. A história de 7 pessoas diferentes que dividem um grupo de estudos em uma universidade pública é apenas o pontapé para narrativas geniais. Meus favoritos são os episódios do baile à fantasia e Abed incorporando Batman; o de Halloween, em que todos viram zumbis comendo carne estragada e o melhor de todos: aquele em que todos viram personagens de um jogo de Nintendo 8-bits. Não tem como não amar.


Jim Rash:

            Além de ator, Rash é roteirista (ele escreveu Os Descendentes, filme do George Clooney). Mas, aqui, como o espalhafatoso e afeminado reitor Pelton, ele chega a roubar a atenção do elenco principal quando aparece em cena. Destaque para a atuação no segundo episódio do final da segunda temporada sobre a guerra de Paintball (em que ele divide a tela com o também surpreendente John Goodman).

Piscou, dançou:

            Outra genialidade da série é a vontade de rever episódios para pescar referências e situações que não estão só no plano principal, mas espalhados pelo fundo do cenário, objetos, diálogos, figurantes e até macacos. E nada aqui é gratuito. Todas as situações são orgânicas e fazem parte da história principal da série. Quantas produções hoje podem se gabar de serem assim?
Aqui, reparem Abed salvando uma grávida no fundo das cenas. Ele só aparece realmente em cena no final do episódio:


Aqui, os personagens citam Beetlejuice três vezes em referência ao filme Os Fantasmas se Divertem, ao longo de três temporadas. Adivinha quem aparece como figurante em outra cena lá atrás na última?:





Motivo Extra:


Alisson Brie (Um bom motivo pra vocês verem a série, não?)

sábado, 16 de fevereiro de 2013

O Homem da Máfia (Killing Them Softly, 2012) - Andrew Dominik



Há uma estranha relação entre a política e a estrutura da máfia americana. Nos dois casos, o dinheiro e as relações de poder são os que movem ambas as engrenagens. Porém, como acontecem com o poder institucionalizado, a máfia  é uma instituição decadente naquele país.

No novo filme do diretor Andrew Dominik (do excepcional O Assassinato de Jesse James),  a relação entre os poderes correm em parelelo. Na primeira cena, a trilha sonora é cortada por discussos de George W. Bush, que na cronologia que a história corre, estava deixando o poder. Enquanto um personagem caminha, as calçadas de New Orleans estão tomadas por lixo de campanha, mostrando que a corrida eleitoral daquele ano seguia a todo vapor para a vitória de Barack Obama.

Durante todo o filme, 90 ligeiros minutos, a maioria das cenas têm televisores e rádios ligados nas declarações dos presidenciáveis, e suas frases de efeitos escritas por ghost writers. Muitas vezes, a voz dos políticos é a única trilha sonora que ouvimos. É numa dessas cenas que conhecemos a casa de jogos onde os mafiosos se encontram para apostas em pôquer e são roubados por dois bandidos armados.


Entra em cena então o matador profissional Jackie Coogan (Brad Pitt), contratado pela organização e intermediado por um desesperado advogado (vivido pelo ótimo ator Richard Jenkins), que vive de aparências. Pitt, ao contrário dos seus pares, ainda é um mafioso a moda antiga. Não é a toa que em sua primeira cena, ele surja com roupas que parecem sair de algum Blaxplotation da década de 70 e ouvindo The Man Comes Around, de Johnny Cash.

Coogan vive hoje em um mundo onde o dinheiro não é mais esbanjado. Pelo contrário, os contratos são feitos sob intensa negociação. A crise financeira apenas mantêm homens sob decadência obscurecida. O matador de James Gandolfini aparece saindo do aeroporto puxando sua mala como um executivo, mas não passa de um matador enfraquecido pelo tempo.



Em meio a longos diálogos expositivos e cenas longas e tensas (como o segundo assalto ao cassino ilegal), Dominik não economiza no revezamento entre o realismo e a encenação estética. Enquanto uma surra em um personagem é encenada de maneira absurdamente gráfica (é possível ouvir os ossos do rosto se quebrando), a morte, igualmente violenta, é filmada de maneira plástica, em câmera lenta, com efeitos especiais. É como se Martin Scorsese se fundisse com John Woo e Sam Peckimpah. E longe de estar no patamar desses ícones, Andrew Dominik vem colocando seu nome entre os grandes diretores da atualidade. Espero ansioso por sua próxima produção.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Amour - 2012, Michael Haneke


Michael Haneke gosta de torturar o seu público. Em Violência Gratuita, levava o telespectador ao extremo da violência, jogando-o como cúmplice. Já no filme Caché, este era obrigado a acompanhar o olhar voyuer dos protagonista, levando o cinéfilo ao extremo da metalinguagem do cinema. Em Amour, sua mais recente obra, a tortura é imaginada usando todos os recursos estilísticos e técnicos do cinema em um exercício quase sádico.

 Amor acompanha um casal francês (vividos de maneira dolorosamente intensa por Jean-Louis Trintignant e Emmanuelle Riva) que  compartilha todos os segredos, gostos e hábitos diários há muitos anos. Mas, os mesmo anos são cruéis com o ser humano e o processo de deterioração do corpo é inevitável.
Aqui, Haneke prova sua genialidade. Os planos longos e silenciosos expõem todo o incômodo que um deles tem que enfrentar diante de uma rotina cruel que vai se impondo. Não há mais música que relaxe. E um simples gesto de dar água se transforma em um sacrifício dificil de lidar, e não é a toa que a violência acaba subindo à superfície, vergonhosa e sofrida.

O filme viaja para o futuro na primeira cena, enquanto policiais abrem o quarto trancado, com fitas e chaves e encontram um corpo sereno, sem vida, mas poeticamente ameaçado pelo fedor que incomoda quem está ali. Essa dicotomia entre o belo e o morto trespassa por toda a película. Música e silêncio. Vida e Morte.
A imagem da platéia de um concerto que nunca é mostrado reflete bem a angústia de se deparar com algo que não podemos dominar. Somos incapazes de virar a câmera pra ver o palco. E assim, obrigados a focar apenas na platéia, ficamos. Assim é a Morte. Nada podemos fazer, a não ser contemplar aquilo que ela quer.


E como é amargo o gosto de sua aproximação. Não há poesia em ver alguém que se ama prostrado na cama, e se sentir incapaz. O gesto, extremado, é chocante, mas compreendido. A renúncia poderia significar um recomeço, em um sonho quase absurdo, de ver a simples rotina de lavar pratos e sair para passear de volta. Mas, o impossível toma conta e só resta aprisionar o resto de amor que a amargura não levou em uma caixa. Aquele velho quarto, de tantas memórias. Afinal, enterros não valem a pena. São bizarros, na palavra do próprio protagonista. E sobra apenas a falsa ironia do título da obra.