terça-feira, 28 de outubro de 2014

Loucura, redenção e morte na cidade grande



(Texto originalmente publicado no Diário do Pará, caderno Você, na coluna #Diáriocultural do dia 28/10/2014)

Era o ano de 2007, que durante o trabalho na Feira do Livro me deparei com uma graphic novel diferente chamada Cidade de Vidro (lançada pela editora Via Lettera). O chamou a atenção, primeiramente, era o nome dos envolvidos na obra: David Mazzucchelli (Batman: Ano Um/Asterios Polyp) e Art Spiegelman (Do espetacular retrato autobiográfico da segunda guerra Maus). Depois, que se tratava da da adaptação de um conto de Paul Auster, um escritor americano de detetives que eu, confesso, nunca tinha ouvido falar. A história faz parte de um livro chamado Trilogia de Nova York. Por fim, o preço era convidativo, pois estava em uma daquelas gôndolas de promoções que as livrarias expõem na feira. Levei para casa e comecei a ler no dia seguinte.
Para minha surpresa, era mais que uma história de detetives. Auster criou um conto urbano triste e surrealista. Um desafio que Mazzucchelli e Spiegelman tiraram de letra. Os dois criaram metáforas visuais belíssimas e transições de páginas elegantes para explorar a mente de um escritor que se isola da cidade após a morte trágica da mulher e do filho pequeno. O personagem escreve histórias encomendadas sobre investigações e criou um pseudônimo, pelo qual confunde sua própria identidade. Até que ele recebe uma ligação enganada para o detetive de sobrenome Auster, cuja missão seria proteger um jovem com problemas mentais da fúria religiosa do pai. Para isso, o escritor decide se libertar de su as próprias angústias, assumindo o avatar enganado.
Só que a situação se mostra mais complexa que ele esperava. O protagonista entra em uma espiral de loucura digna de uma atmosfera kafkiana. Símbolos religiosos (como o mito da Torre de Babel) são usados para estabelecer simbiose com a hipocrisia humana e a falta de diálogos entre as pessoas. Daniel Quinn se envolve tanto com os “clientes” que termina preso no labirinto das suas próprias dores e lembranças. A sequência final é de uma melancolia cortante.
O estilo de escrita de Auster na HQ divide os dois pés entre o fantástico e a crueza da realidade, como James Ellroy e Raymond Chandler, que são conhecidos por suas adaptações ao cinema. Ellroy escreveu o ótimo livro Los Angeles – Cidade Proibida, adaptado e dirigido por Curtis Hanson. Já Chandler escreveu em Hollywood alguns dos mais populares filmes Noir, como Dália Negra (clássico de 1946, que ganhou uma refilmagem insossa de Brian de Palma) e Dupla Identidade.
Por tudo isso, Cidade de Vidro pode ser considerado um clássico da arte sequenciada. Mais que bom quadrinho, é bom cinema. Algumas páginas parecem criar planos sequências imaginados por um híbrido cinematográfico de De Palma e David Lynch. Em outras, a história quebra a própria barreira das Hqs e o desenho se “espalha” pelo espaço todo, como uma moldura de um belo quadro. Um clássico dos quadrinhos, que poderia ser chamado também de bom cinema e excelente literatura.

terça-feira, 21 de outubro de 2014

Não vá à cozinha de madrugada

(Texto originalmente publicado no Diário do Pará, caderno Você, coluna #DiarioCultural de 21/10/2014)


            Desde a estreia de do eficiente Sobrenatural (Insidious) em 2012, os filmes com histórias de casas mal assombradas (ou os Ghost Houses) voltaram a fazer sucesso, graças à fórmulas simples que seguem, que atraem sempre público e crítica e não exigem orçamentos vultuosos. Basicamente são roteiros de fantasmas que se passam em locais pequenos, geralmente casarões antigos, carregados de pequenos sustos, trilha sonora de tensão e, claro, angústias provocadas nos personagens, geralmente famílias com filhos pequenos.
            Nesses casos, o desafio é manter o interesse na narrativa até o final, além do diretor conseguir trabalhar em planos fechados quase o tempo todo. E eles têm conseguido, principalmente James Wan, que dirigiu Sobrenatural e o ótimo Invocação do Mal (que virou um sucesso imediato), além de produzir o atual Annabelle (Annabelle), sobre a apavorante boneca de pano. Em comum, as histórias partem dos casos investigados pelo casal de paranormais Ed e Lorraine Warren, que inclusive participam dos filmes como personagens fictícios. Mas, muitos anos antes, a dupla já teria um caso famoso adaptado: Terror em Amityville (The Amityville Horror)  Clássico de 1979, teve inúmeras continuações ruins e uma refilmagem sem graça. Também fazem parte da nova safra o excelente A Entidade  (Sinister), o melhor de terror de 2013 e o tolo Atividade Paranormal (Paranormal Activity)
Os mais antigos que me lembro são A Casa dos Maus Espíritos (House on Haunted Hill), de 1959, um ótimo exemplar do gênero com Vincent Price e Desafio do Além (The Haunting) , do diretor Robert Wise ( também dirigiu de um dos meus filmes de terror favoritos: O Túmulo Vazio). O início dos anos de 1980 produziram dois clássicos absolutos para os cinéfilos: O indiscutível O Iluminado (The Shinning), obra prima de Stanley Kubrick e o surpreendemente Poltergeist, o Fenômeno (Poltergeist). Outro que sempre está na lista dos melhores é o “terrir” A Morte do Demônio (Evil Dead).Misturando comédia com horror ainda temos os ótimos A Casa do Espanto (House) e Os Fantasmas se Divertem (Bettlejuice), que despertam uma certa nostalgia também dos anos 80 e o bizarro O Segredo da Cabana (The Cabin in The Woods).
Outros bons exemplares cinematográficos para tomar sustos são 1408 (1408), também baseado em livro do escritor Stephen King (assim como O Iluminado e Rose Red, A Casa Adormecida ) e Sessão 9 (Session 9), um obscuro, porém ótimo exercicio de estilo de Brad Anderson. De diretores espanhois temos Os Outros  (The Others), que por sinal, é uma refilmagem de Os Inocentes (The Innocents) e o O Orfanato. O primeiro de Alejandro Amenábar e o segundo, do diretor Juan Antonio Bayona. Bem, com essas dicas é só preparar o espírito, literalmente, para ter bons sustos e depois não esquecer as regras do gênero: Não vá à cozinha de madrugada, não abra armários, e principalmente, não olhe debaixo da cama.

terça-feira, 14 de outubro de 2014

A febre dos desenhos animados


(Texto originalmente publicado na coluna #DiárioCultural do caderno Você, no Diário do Pará, edição de 14/10/2014)

Dois desenhos animados têm sido sucessos de público e crítica, digamos assim, este ano: Peppa Pig e Hora da Aventura. Apesar de tão diferentes e destinados para públicos diversos, eles ilustram o fascínio que este tipo de obra ainda causa nas crianças, jovens e  - por que não? – em adultos.
Peppa é a nova moda entre os pequeninos e narra a história de uma porquinha rosa, simpática e questionadora, em diversas aventuras cotidianas com a família. É o tipo de desenho educativo que tem se multiplicado, graças ao crescimento das assinaturas de TV a cabo e o sucesso do Netflix, como a dupla Diego e Dora Aventureira (que meu filho adora), Super Fofos e Pocoyo. São seriados que ensinam, atravésde roteiros de aventura, matérias sobre Matemática, português, além de valores como ética e amizade. São altamente indicados para as crianças, naquela hora de folga entre a escola e as brincadeiras com os pais.
Já a Hora da Aventura, faz parte de um gênero de desenho que não se define para que público é destinado. Os traços são infatilizados, mas os roteiros surpreendem pelo tom lisérgico e subversivo. É um tipo de humor que mistura Phineas e Pherb com Family Guy, com menos sutileza que Os Simpsons e menos perversão e e escatologia que South Park. Finn e seu cão Jake descobrem um mundo louco habitado por todo tipo de personagem tirados de uma viagem de LSD. Quem acusa o mesmo de ser politicamente incorreto esquece de como eram estranhos os antigos, como Pica-Pau, Pernalonga, Tom e Jerry e Caverna do Dragão. Era um festival de cenas de violência, traições, mortes, que poderiam ter traumatizado uma geração de crianças, o que não foi o caso.
Mas, o ponto é que desde os anos de 1950, quando a televisão invadiu os lares, as gerações têm seus desenhos animados de preferência e, geralmente, de qualidade. Desde as Aventuras de Tim-Tim, A Pantera Cor de Rosa, Popeye, Os Jetsons, Flintstones, Gato Felix, Johnny                Quest e Space Ghost até as excelente adaptações de quadrinhos, como Batman e X-men (os dois dos anos 90), As Tartarugas Ninjas, He-Man e a Patrulha Estelar. Na minha memória, também ficaram obras divertidas, como Animaniacs, Ducktales, Speed Racer, Thundercats, Swat Kats e Comandos em Ação.
Cada época tem seus desenhos favoritos. Alguns permanecem no ar por décadas e décadas nos canais abertos e, principalmente, em canais infantis da televisão fechada. Muitos também estão com licença liberada na internet. Assim, você pode, sempre que quiser, sentir o clima nostálgico de infância que um bom desenho traz. 

Verhoeven
Tema da minha primeira coluna aqui no DIÁRIO, Paul Verhoeven volta a ser homenageado e exibido em Belém. Nesta quinta-feira (16 de outubro), o Cine CCBEU exibirá Instinto Selvagem, a obra mais famosa do holandês maldito. A sessão será ás 18h30, no cine teatro do CCBEU, que fica na travessa Padre Eutíquio, 1309. A entrada é franca e vale a pena conferir suas obras na tela grande.