Tenho duas imagens bem distintas, porém igualmente fortes na memória, quando o assunto é a saga da família de Leatherface. A primeira remete ao desconforto e tensão que tive ao assistir ao filme de Tobe Hooper, o clássico de 1974. Não foi medo, mas algo além disso, uma espécie de transe, similar àquele estágio angustiante entre o sono e o despertar, quando os pesadelos se tornam bem reais. A segunda imagem é de uma histeria coletiva de risos. Uma tarde de trabalho em que a redação do jornal parou para acompanhar a parte dois da série, um amontoado de absurdos que desafiava qualquer lógica e desde então se inseria na categoria de um dos maiores filmes trashs que já vi na vida. A cena final com a sobrevivente girando a motosserra no ar arrancou aplausos entusiasmados de todos os presentes.
O Massacre da Serra Elétrica é assim: oito ou oitenta, indiferente não dá para ficar. Eu, particularmente, gosto de todas as encarnações da história. Leatherface e seus pares são personagens instigantes, seja provocando o terror ou a comédia. Sim, porque embora ele seja um ícone do cinema de horror baseado na seriedade do filme original, do que veio depois pouco se salva para o gênero, apenas alguns sustos e, claro, o fato de haver litros de sangue falso jorrados pelas vítimas do maníaco. Mas é tudo tão nonsense, tão descabido e feito nas coxas, que você não compra as tramas apresentadas, não te tocam como a primeira versão. Mas podem ser consumidas como passatempos, dá pra se divertir.
Todas as gerações já tiveram contato com algum exemplar da franquia, seja uma sequência, remake ou um “prequel” (história de origem). Talvez o que tenha ficado mais marcado seja a infame refilmagem de 2003, com Jessica “Camiseta Molhada” Biel, que, por vias tortas, manteve o tom claustrofóbico do original, proporcionado por uma irritante linguagem de videoclipe, na moda à época. Agora, para aproveitar a onda, também irritante, do 3D, eis que surge uma sequência que ignora tudo o que veio após o filme de 74, mas que segue a mesma regra de todos aqueles cuja pretensão tentou sufocar ao se declarar a “continuação oficial”: clichês à exaustão, com alguns pontos positivos aqui e ali.
A cartilha é conhecidíssima: grupo de amigos da cidade vai para uma cidade do interior, onde um por um, serão surpreendidos pelo assassino. E claro que não falta a mocinha tropeçando enquanto foge e as demais vítimas fazendo as piores e inconcebíveis escolhas. Algo como na paródia Todo Mundo em Pânico, em que ao se deparar com uma placa indicando as direções para “Morte” e “Segurança”, a opção é sempre pelo primeiro caminho. Fora que a simples leitura de uma carta logo no começo – recomendada com fervor por um dos personagens – teria evitado... Bem, teria evitado que o filme acontecesse. Deixando a metalinguagem de lado, o diagnóstico só pode ser burrice aliada a uma extrema falta de curiosidade.
De positivo, embora também inverossímil, a virada final, que parece ter se inspirado no ideal de Zé do Caixão ao exaltar a linhagem, o sangue, como uma verdadeira fonte de poder, e o fato de subverter as regras da “última garota” para criar uma intimidade forçada e até nossa simpatia com a “causa” do vilão. Um desfecho improvável, mas que pelo menos escapou do lugar comum. E, cá pra nós, na altura dos acontecimentos qualquer surpresa era bem-vinda, valia tudo, pois não é possível que alguém ainda estivesse levando o filme a sério. Ele já se enquadrava no rol dos trashs, tinha mesmo que fazer por onde.
O primeiro O Massacre da Serra Elétrica, portanto, continua único. Ali você pode ter uma noção dos crimes cometidos por Ed Gein, que serviram de base para a criação da saga. Dá medo, causa palpitações. É sensacional. O resto é Hollywood brincando com ketchup, botando em prática ideias estapafúrdias, atuações ridículas, roteiros furados e, intencionalmente ou não, engraçados. O que, para quem gosta de filmes trashs, também é sensacional. Escolha o que mais lhe agrada, não leve em consideração que a “serra elétrica” na verdade é uma “motosserra” – cortesia dos tradutores brasileiros – e bom massacre.
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