Os valentões, as patricinhas, os CDF's, os esportistas, os esquisitos... Essa é a divisão básica (e preconceituosa, claro), as classes existentes no universo escolar, com uma ou outra variação. Em todo lugar do mundo é assim. Um processo de seleção natural que deixaria Darwin orgulhoso, pois as crianças e adolescentes, forçados a dividir aquele espaço todos os dias, durante anos, desenvolvem um senso de adaptação e sobrevivência impressionante. Dentro de seus grupos, estão protegidos, passam por essa fase da vida quase sem traumas. O problema acontece quando há um desvirtuamento desse esquema. Uma troca de colégio, de turma, sem os amigos para ajudar. Foi o que aconteceu com Casey Heynes, mais conhecido como garoto Zangief.
Casey se tornou um fenômeno midiático. Não lembro de ter visto uma tag durar tanto tempo no Twitter. Uma semana depois do ocorrido, lá estava ainda #zangiefkid nos TT's. Redes de televisão correram para entrevistá-lo, conhecer a história do moleque de quinze anos que resolveu dar um basta às provocações que sofria e, num golpe que lembrava o lutador Zangief, do jogo de videogame Street Fighter (o famoso pilão), botou para correr o seu oponente. Sozinho, sem o grupo para protegê-lo, Casey era presa fácil. Encurralado nos cantos da escola e nas suas imediações, era humilhado. Tinha medo. Justificável, pois sempre era cercado de forma covarde. Nunca era no "mano a mano". Triste, pensou em suicídio. Mas achou força para reagir. Virou herói. Exemplo.
A violência não pode nem deve ser estimulada. Mas nesse caso, não há como deixar de exclamar: "boa, moleque, é isso aí". Afinal de contas, ele apenas se defendeu. Mostrou que tem sentimentos, que merece ser respeitado. Não é melhor, nem pior que ninguém, só quer ter o direito de ir e vir assegurado. Nas entrevistas que deu, Casey se mostra embaraçado com essa fama repentina. Não almejou isso. Riu ao ser perguntado se era um super-herói. Queria ser um. Que garoto não queria? O importante para ele é o apoio. Antes sozinho, tem o mundo ao seu lado agora. Pelo menos o virtual. Mensagens chegam a ele de todas as partes. Meninos e meninas que viram nele uma esperança, que sofrem com o bullying e vislumbram uma luz. A mudança pode estar perto.
O pai de Casey se mostrou chocado. Não sabia o que dizer, gaguejava. Desconhecia o que o filho enfrentava. Ele sofria calado. Mesmo tendo a irmã como porto seguro, para um menino, não ter o pai ali, do lado, é cruel. Quem sabe isso tudo não os aproxime? Conversar, fazer coisas juntos. Ainda há tempo. Basta querer. Agora, eu queria ouvir também o outro lado. O do garoto agressor. Ele também deve ter uma história interessante. Por que age dessa forma? Como é a sua estrutura familiar? Ninguém se propôs ainda a ouvir a sua versão. Ele não é apenas o vilão. Tachá-lo assim é ser maniqueísta, tapar os olhos para a realidade. Talvez ele tenha tantos problemas quanto Casey. Não enxergar isso é entrar na onda da divisão de classes exposta no primeiro parágrafo. É ser preconceituoso.
John Hugues retratou isso com perfeição no clássico oitentista "Clube dos Cinco". Juntou um representante de cada "classe" e os colocou numa sala de aula, onde teriam que passar um dia inteiro juntos, convivendo. Lá, eles descobriram que tinham muitas afinidades e, que, apesar de todas as diferenças, podiam ser amigos. Mas isso seria por aquele dia somente. Fora daquele ambiente, o simples fato de conversar entre eles, de dar atenção, seria mal visto entre os membros dos seus respectivos grupos. Onde já se viu uma patricinha dar bola para um nerd? Um esportista bonitão tratar igualmente um desajustado? Eles se tornariam párias. E ninguém queria isso. O jeito seria fingir. Hipocrisia. É o mal da sociedade. E isso já se aprende na escola. Uma pena.
Um comentário:
O bullying, nos Estados Unidos, é uma instituição tão sólida quanto o WTC, atirar em veadinhos na temporada de caça e xingar portoriquenho de mexicano.
Postar um comentário