O Oscar não serve exatamente como parâmetro de
qualidade, já que não devemos esquecer que a indústria é movida pelo lobby e
marketing e, por isso, sempre cometeu injustiças. Por outro lado, é um
indicativo de como o cinema comercial se vê e o que ele espera dos
espectadores. As mudanças mais significativas estão no destaque maior em
histórias sobre diferenças sociais e abordando temas como racismo (Corra!).
Além é claro, de abrir portas para o protagonismo feminino na direção (Greta
Gerwig concorre com Lady Bird).
Em 2018, há um caso que talvez seja o amálgama de tudo
isso: Me Chame Pelo Seu Nome (Call Me By Your Name). Um roteirista veterano
(James Ivory, baseado no livro de André Aciman) se junta a um experiente
diretor (Luca Guadagnino) e criam uma obra, ao mesmo tempo, singela e dura.
Crua e fantasiosa. Ao abordar a relação intensa que surge entre um pesquisador
e o filho de um professor universitário, que o hospeda em sua casa, na Itália,
o filme exala erotismo e paixão por todos os poros, sob o intenso sol do verão
italiano da década de 1980.
Não é fácil se envolver pela narrativa. A
construção lenta, com poucos diálogos, só funciona se você conseguir
acompanhar, aos pedaços, cada movimento dos personagens e suas relações com o
ambiente. Há ainda uma certa arrogância intelectual no ar, que sacrifica o
envolvimento pessoal do espectador, mas o mantém desperto, como um antropólogo
curioso diante da descoberta de um monumento histórico.
Guadagnino mantém a direção firme em suas mãos,
seja nos planos aberto, onde a paisagem se sobressai, seja na aproximação quase
carnal da câmera nos corpos em exposição. E a metáfora com as curvas das
esculturas gregas e as silhuetas em forma dos atores e atrizes não passa
despercebida. O diretor se cerca da fotografia calorosa de Sayombhu
Mukdeeprom e a trilha agridoce de Sufjan Stevens para decretar suas
libidinosas, mas legítimas, intenções temáticas.
É preciso destacar ainda o corajoso entrosamento
entre os protagonistas vividos por Armie Hammer (que quase estragou sua
carreira com o horroroso Cavaleiro Solitário) e Timothée Chalamet. Se o
primeiro consegue atravessar uma persona charmosa e antipática e transformá-lo
em um ser humano cheio de dúvidas, é Chalamet que segura a obra com uma atuação
brilhante, transmitindo com o olhar ou pequenos gestos corporais toda a dúvida,
raiva, medo e felicidade de um jovem que está se descobrindo, como um músico ao
construir uma canção, nota por nota. Para finalizar, é quase impossível ficar
indiferente ao monólogo final de Michael Stuhlbarg (grande ator que merece
maior reconhecimento) sobre a vida e o amor.