quinta-feira, 10 de agosto de 2017

A música como protagonista



Baby Driver (2017) é ótimo como cinema, sem necessariamente ser um filme excelente. Parece contraditório? Não necessariamente. Edgar Wright é um diretor que sabe surpreender. Tem ousadia e domínio técnico das suas obras, como já provou em ótimas produções, como Todo Mundo Quase Morto, Chumbo Grosso, Scott Pilgrim contra o Mundo e os Heróis da Ressaca. Trabalha bem com montagem rápida e planos ousados. Mas, na sua nova “experiência”, ele leva a sua habilidade técnica a um novo patamar.
Afinal, Wright trabalha, aqui, exclusivamente para a edição de som e montagem. Por isso, é importante destacar ainda o trabalho musical de Steven Price, além da edição de Jonathan Amos e Paul Machliss. O fato do personagem principal ter um problema de audição e ouvir canções no fone de ouvido inteiro é uma desculpa interessante para ter trechos de músicas em quase todas as cenas. E é impressionante como estas casam exatamente com as cenas e os sons ambientes. Desde os pneus de carro que “cantam” em momento de um scratch em uma cena, até o tiroteio que segue o tom da bateria em outra.
Há um plano inteiro com o protagonista andando na rua, em que todo o barulho da cidade e pessoas são incorporados ao ritmo do que toca na trilha sonora, que conta com músicas de Commodores, Barry White e Jon Spencer Blues Explosion. Seria muito justo se houvessem algumas indicações ao Oscar nesses quesitos. Esse trabalho não funcionaria bem se o elenco não “abraçasse” a idéia. E eles aceitam entrar na brincadeira. A inexpressividade de Ansel Elgort cai como uma luva para o seu indiferente personagem, enquanto Kevin Spacey já traz uma persona habitualmente ameaçadora e Jamie Foxx está perfeito como o bandido quase psicopata. Destaque ainda para Lily James e Elza Gonzalez, com personagens femininas fortes, mesmo com personalidades opostas.
Mas o diretor se preocupou tanto com a parte técnica, que o roteiro acabou um pouco negligenciado. Ele homenageia o gênero road movie de assalto, como Caçada de Morte, Os Implacáveis (com direito a closes de volantes, marchas e aceleradores, típicos da obra de Sam Peckimpah) e Drive, mas se perde nas próprias influências, ao situar a narrativa no mais do mesmo. A história: um jovem habilidoso no volante, mas com problemas psicológicos e auditivos causados por um acidente trágico é forçado a trabalhar para uma organização criminosa especializada em assaltos a bancos. Ao mesmo tempo, ele se apaixona por uma garçonete e precisa protegê-la dos bandidos, além de salvar a própria pele.
E é isso. Nada de novo. Há uma necessidade de dividir a narrativa em atos, e alguns funcionam bem. Outros são mais arrastados, prejudicando a produção nas suas duas horas de duração. Mesmo assim, é uma experiência cinematográfica como poucas, para se apreciar e depois estudá-la junto às teorias da sétima arte. E depois baixar a trilha sonora, para repetir os movimentos de Baby. Só não escute enquanto estiver dirigindo.Pode ser arriscado.