sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Juan dos Mortos

Um filme de zumbi que vai ao encontro das duas principais vertentes deste subgênero do terror e que, na maioria das vezes, são antagônicas. Assim é “Juan dos Mortos”, que se utiliza de críticas sociais à la Romero ao mesmo tempo em que dá aos seus personagens uma dimensão cartunesca. Essa união já foi tentada em inúmeras ocasiões - certa vez de maneira brilhante, em “Todo mundo quase morto” -, mas, invariavelmente, naufraga, pois o produto final sempre pende para um dos lados, não há um equilíbrio. Ou o amargor e desespero da situação são esquecidos em prol da comédia ou a produção descamba para o humor que se pretende negro, mas não passa de mau gosto. 
Nesse aspecto, “Juan dos Mortos” está acima, bem acima da média do que costumamos ver por aí. O filme cubano jamais deixa de lado a tensão provocada pela contaminação zumbi e as consequências que dela recaem sobre a população de Havana, principalmente a sua parcela mais pobre; assim como consegue extrair daí a graça, o riso, exagerando de forma proposital na construção dos habitantes da cidade, pessoas acostumadas a sobreviver em meio ao caos, tornando-os caricatos, os heróis possíveis naquele contexto – seja o de ruas infestadas por zumbis ou dificuldades sociais e econômicas, em uma crítica direta ao governo de Castro. 
Essa alegoria política está explícita na forma como as autoridades tratam do assunto, minimizando os ataques e jogando a responsabilidade em dissidentes que agem sob as ordens norte-americanas, ignorando a crise e o desespero da população. Nada muito diferente das atitudes de muitos governos que aprontam das suas e tentam desviar o foco dos problemas reais, numa verdadeira ópera bufa. 
Com isso, são válidos, por exemplo, os artifícios usados pelos protagonistas para escapar daquele inferno, mas que, em outra situação, poderiam ser considerados amorais, como montar uma empresa especializada em matar os entes queridos dos clientes; ou, então, ir em direção a um paraplégico na cadeira de rodas perseguido por zumbis, voltar apenas com a cadeira e soltar a pérola: “Ele faleceu. Tivemos que deixá-lo. Não necessariamente nessa ordem”. 
Embora o baixo orçamento não tenha permitido que os efeitos visuais rivalizassem com os das produções de Hollywood, o diretor Alejandro Brugués consegue manter o nosso interesse pelas criaturas. E, de certa forma, esse trabalho mais artesanal confere até mais peso ao que o filme se propõe, combina com a realidade paupérrima demonstrada. Fora que o diretor ainda traz soluções inventivas em termos de linguagem cinematográfica, como na cena da decapitação em massa de zumbis por um carro, além de gags divertidas envolvendo (pasmem) medo de sangue. E assim o filme segue até o final, com criatividade, nonsense, teor crítico e um heroísmo às avessas.